sábado, fevereiro 26, 2005

Existe um pesar que me habita. Não tem nome, mas tem cheiro. O teu cheiro. Que pode ser cheiro de reticências ou de chuva – prefiro reticências à chuva quando estou sozinho,mas isto não é apenas uma questão de gosto. Cheiro de página dentro da gaveta. Cheiro de sol lentamente encoberto pela noite. Vida em partículas cristalinas – limpa, limpa demais.
Não existe felicidade possível. Você apenas simula e acredita – e as manhãs parecem azuladas. Finge não sentir o medo do mármore cobrindo os olhos. Quando a noite fica cinza, põe-se a cantar - mas as cantigas de roda ficaram pra trás. Procuras nas entranhas por um sinal de deus, um sinal que te fizesse sentir a presença divina. Nada surge e na medula um eco oco te devolve ao início de tudo – não existe felicidade possível. Repita! Repita! Não existe felicidade possível...não.

segunda-feira, fevereiro 21, 2005

Um dia, disse estar exausto. As alvoradas sempre lhe pareciam desertas – nem sons, nem fuligem...nada. Velhas estradas, nada além das mesmas estradas, eis o que lhe resta [enraizar-se na distância já percorrida enfraquece os músculos, rouba o ar e pulveriza os sentidos] Homem construído pela dor e pelo descaso, traz nas mãos um sol que não soube brilhar – só quando sorria[já era nunca quando a última estrela cadente passou – o céu estava calado demais pra saber dos seus horizontes febris]
Dos teus sonhos não lembras, mas sabes serem as mesmas paisagens- num misto de agonia e esperança, as portas estão lacradas. Chove na madrugada e o teu corpo ainda acusa sinais de cansaço – mais um dia como todos, a total ausência de sentido chamada de fé. São pequenos os ruídos que se amontoam pela mobília – podes escrever palavras ou cores, mas nada te fará escapar ao tormento das auroras por nascer.
As fronteiras alargadas pela decadência – as cores me invadem e somem, sem avisar. O medo reside nas virtudes – os ossos testemunham o frio da perda. É preciso ruir quando adormecem os girassóis – e nada, nem o cinza que brota da alma se faz compreender aos olhos nus. Tudo vai sumindo ao mesmo tempo que ocupa cada centímetro da solidão – não deixando nada do que sou, em paz.

segunda-feira, fevereiro 14, 2005

Queria apagar qualquer traço que fosse capaz de trazer lembranças. As palavras se mostraram poucas. As cores, frágeis. Os sons só aumentam a saudade [saudade que faz do entardecer abismo]. Restam imagens feitas de cinzas– preciso vomitá-las para ser poesia.
dos olhos às rachaduras das paredes - foram-se os sonhos - quadros envelhecidos - esperança engasgada - a súbita presença da vida - pequena e calada – fria e rígida - feito amor desenterrado.

quinta-feira, fevereiro 10, 2005

Na espera arrastada pelo amanhecer, madrugada parece vazada [há um lado azul na solidão, o que mais pesa. O amarelo, não exala cheiro. Rarefeito, o vermelho acelera o pulso.] Não falo do que me amortalha – existe um gosto de quarto abandonado nas cores secundárias.

terça-feira, fevereiro 08, 2005

esquecido. os jardins sem papoulas. a lua sem noite. o menino sem sonhos. a solidão de ti

sábado, fevereiro 05, 2005

As letras têm cores, sei. Quando tocam as paredes, deserto. Quando alcançam os móveis empoeirados, horizonte. Lambendo o mar, sussurro. Nas fotos sobre a cama, melancolia. Ao sentirem o coração, sonho. No meio da chuva a brincar, encantamento.